Santo Tomás de Aquino explica como serão as almas depois da ressurreição

24/12/2021

No Credo, a oração de nossa fé, há uma pequena frase; "Creio na Ressurreição da Carne". Pronunciada milhares de vezes por católicos em suas orações todos os dias. Mas poucas pessoas sabem exatamente como isso ocorrerá e como seremos após a ressurreição. Mas Santo Tomás de Aquino esclarece em detalhes como isso ocorrerá e como serão as almas com os corpos ressuscitados. O Santo explica:

"DEPOIS DA RESSURREIÇÃO NÃO HAVERÁ MAIS USO DE ALIMENTOS NEM DA FUNÇÃO GENERATIVA

Porque, afastado o fim, deve ser removido tudo o que se destine ao fim, convém que, afastada a mortalidade dos ressurgidos, sejam também removidas as coisas destinadas ao estado viatório, tais como o alimento e a bebida, que são necessários para a subsistência da vida mortal, enquanto o que é destruído pelo calor natural seja restaurado pelos alimentos: não haverá, portanto, após a ressurreição, o uso dos alimentos nem das bebidas.

Do mesmo modo não se usarão as vestes, pois elas são necessárias para que os corpos não sejam corrompidos pelo calor ou pelo frio, vindos de fora.

Deverá cessar também o uso das funções venéreas, pois elas ordenam-se à geração dos animais. A geração, com efeito, serve à vida mortal, para que, já que o homem como indivíduo não pode ser conservado, conserve-se, pelo menos, como espécie. Mas como, após a ressurreição, os homens serão conservados individualmente para sempre, não haverá então lugar neles para a geração, nem, consequentemente, para o uso das funções venéreas. Além disso, como o sêmen é uma decorrência da nutrição, cessada esta, cessará também o exercício das funções generativas.

Não se pode afirmar convenientemente que o uso dos alimentos, das bebidas e das funções venéreas devam permanecer só para o deleite. Nada, com efeito, será desordenado naquele estado final, porque nele cada coisa, a seu modo, receberá perfeita consumação. Ora, a desordem opõe-se à perfeição.

Sendo ainda a reparação do homem pela Ressurreição causada imediatamente por Deus, neste estado não poderá haver desordem alguma. Lê-se na Carta aos Romanos: "O que é instituído por Deus é ordenado" (Rom 13,1). É, com efeito, desordenado procurar-se só por deleite o uso dos alimentos ou da função venérea, e, por esse motivo, mesmo agora, entre os homens, usá-los desse modo é tido por vicioso. Portanto, não permanecerá, naqueles que não mais morrerem, o uso da comida, da bebida e da função venérea, só para o prazer.

CONTUDO, TODOS OS MEMBROS RESSURGEM

Embora não haja nos ressurgidos o uso das funções descritas, não lhes faltarão os membros destinados a elas, porque sem eles os corpos não seriam íntegros. É conveniente, pois, que na reparação do homem ressurgido, que será feito por Deus sem algum elemento intermediário, cujas obras são perfeitas, seja integralmente reparada a natureza. Assim, esses membros estarão nos ressurgidos para que seja conservada a integridade da natureza, mas não para os atos a que foram destinados.

Ademais, se naquele estado os homens recebem a pena ou o mérito das ações na terra, como veremos depois, é conveniente que eles possuam os mesmos membros pelos quais serviram, nesta vida, ao pecado ou à justiça, para que sejam punidos ou premiados nos mesmos membros em que pecaram ou mereceram.

OS HOMENS NÃO RESSURGEM COM DEFEITOS

É também conveniente que todos os defeitos naturais sejam afastados dos corpos dos ressurgidos.

Por todos esses defeitos é quebrada a integridade da natureza humana. Porém, se é conveniente que na ressurreição a natureza humana seja integralmente reparada por Deus, é também consequente que esses defeitos sejam afastados.

Além disso, esses defeitos originam-se de uma falha da virtude natural, que foi o princípio da geração humana. Ora, na ressurreição não haverá outra virtude operante, senão a divina. Logo, tais defeitos dos homens aqui gerados não estarão neles, após terem sido reparados pela ressurreição.

RESSURGIRÁ SOMENTE AQUILO QUE PERTENCE À VERDADEIRA NATUREZA

O que foi dito a respeito da integridade dos ressurgidos deve também atribuir-se àquilo que pertence à verdade da natureza humana. O que não pertence à verdade da natureza humana não será também reassumido nos ressurgidos, pois o tamanho deles seria excessivo, se for reassumido tudo que de alimento lhes foi transformado em carne.

A verdade, com efeito, de cada natureza, considera-se conforme a sua espécie e forma. As partes do homem referentes à espécie e à forma estarão todas integralmente nos ressurgidos, não só as partes orgânicas, bem como partes semelhantes a estas, como a carne, os nervos, etc., das quais se compõem os membros orgânicos. Por isso, não será reassumido tudo que naturalmente esteve nessas partes, mas somente o que foi suficiente para a integração de cada uma delas.

Nem o homem deixará de ser numérica e integralmente o mesmo, se aquilo que nele existiu materialmente não ressurgir. É certo que neste estado de vida terrestre o homem permanece, do princípio ao fim da vida, numericamente o mesmo. Contudo, aquilo que materialmente sob a forma das partes existe nele não permanece o mesmo, mas lentamente entra e sai (como um fogo que não se apaga, mas que sempre se conserva porque é sempre reacendido), e, assim, o homem fica íntegro quando lhe são conservadas a espécie e a quantidade devida à espécie.

DEUS SUPRIRÁ TUDO QUE FALTAR NO CORPO DEFORMADO OU NA SUA MATÉRIA

Assim como Deus, para a reparação do corpo ressurgido, não fará ser reassumido tudo que existiu no corpo humano, assim também o que materialmente lhe faltar, Deus suprirá. Se isso pode ser feito pela natureza, de modo que, à criança que não tem o tamanho devido, seja-lhe dado apenas o que lhe é suficiente para adquirir o perfeito tamanho, pela recepção da comida e da bebida, que são de matéria alheia, sem, contudo, perder ela a identidade numérica, com muito mais razão isso pode ser feito pela virtude divina. Será, então, suprido, aos que menos receberam de matéria extrínseca, e que a eles nesta vida faltou para a integridade dos membros naturais, ou do tamanho devido.

Assim, embora alguns não tenham certos membros naturais nem tenham atingido o tamanho perfeito, eles receberão, na ressurreição, pela virtude divina, a perfeição devida aos membros e ao tamanho, seja qual for o tamanho com que tenham morrido.

A RESSURREIÇÃO DOS MORTOS ESTA EXPRESSA NOS ARTIGOS DA FÉ

Para ser confessada a verdade da Ressurreição da Carne, foi colocado no Símbolo dos Apóstolos: "Creio na Ressurreição da Carne."

Não foi sem motivo que só foi posta a expressão carne, pois existiram alguns, ainda nos tempos apostólicos, que negaram a ressurreição da carne, confessando eles que haveria só uma ressurreição espiritual, aquela pela qual o homem ressurge da morte do pecado.

Refere-se o Apóstolo, pela segunda vez, na Segunda Carta a Timóteo, a alguns que se afastaram da verdade dizendo que a Ressurreição já foi feita, e que subverteram a fé de muitos. (2 Tim 2,18; 1 Tim 6,21).

Para afastar o erro deles e para que se creia na ressurreição futura, é dito no Símbolo dos Padres: "Espero a ressurreição dos mortos." (Fonte: Compendio de Teologia; São Tomás de Aquino - da Redação)