Oração, grande meio de salvação

24/08/2023

O imortal Luís de Camões, autor do célebre poema épico Lusíadas, num tocante soneto, diz: "Tu que descanso buscas com cuidado, neste mar do mundo tempestuoso, não esperes achar nenhum repouso, senão em Cristo Jesus Crucificado".

Por Plinio Maria Solimeo

Realmente, neste mundo tão conturbado, encontramos a paz de que tanto necessitamos quando estamos de joelhos numa oração recolhida diante do Santíssimo Sacramento, de um crucifixo, de uma imagem de Nossa Senhora ou de algum santo de nossa devoção. Perante a grandeza e amor infinito desse Deus, sentimos toda nossa indigência, incapacidade e debilidade, e nos tornamos humildes e suplicantes.

Pois a oração é a chave que nos abre todas as portas, nos consola de todas as penas, e nos dá um sentido na vida e alegria de viver.

O que diz o Catecismo da Doutrina Cristã sobre a oração

O Terceiro Catecismo da Doutrina Cristã (ou Catecismo de São Pio X) explica: "A oração é uma elevação da alma a Deus, para adorá-Lo, dar-lhe graças, e para Lhe pedir aquilo de que necessitamos". Porque "a esperança de obter de Deus as graças de que necessitamos é fundamentada nas promessas de Deus onipotente, muito misericordioso e fidelíssimo, e nos merecimentos de Jesus Cristo".

Mas, por que rezar, se Deus sabe de tudo que necessitamos? O Catecismo responde a essa objeção, tão corrente: "Embora Deus saiba tudo aquilo de que necessitamos, quer todavia que nós Lho peçamos, para reconhecermos que é Ele que dá todos os bens, para Lhe testemunharmos a nossa humilde submissão, e para merecermos os seus favores".

Nesse sentido, o famoso teólogo e pregador espanhol Pe. Antonio Royo Marin, O.P. tece algumas considerações[i]: "Todos os que negam a liberdade humana: fatalistas, deterministas, estóicos, valdenses, luteranos, calvinistas, jansenistas etc., geralmente afirmam: 'No mundo ocorre o que tem necessariamente que ocorrer. Tudo 'está escrito', como dizem os árabes. É inútil pedir que as coisas ocorram de outra maneira'".

Explica o renomado teólogo: "É conveniente orar, não para mudar a providência de Deus, que é absolutamente imutável, mas para obter dela o que, desde toda a eternidade, Ele determinou conceder à oração" que fazemos. Ele prossegue, falando do desejo divino: "É um querer de Deus condicional, como se tivesse dito desde toda a eternidade: 'Concederei tal graça se se me pede, e se não, não'. Por isso deve-se pedir sempre as coisas que são conformes à vontade de Deus, porque, do contrário, ademais de desagradá-Lo, nossa oração seria completamente inútil e estéril".

O Catecismo, no entanto, acrescenta: "Para bem orar requerem-se especialmente o recolhimento, a humildade, a confiança, a perseverança e a resignação". Entretanto, adverte que a "primeira e a melhor disposição para tornar eficazes as nossas orações, é se estar em estado de graça ou, não estando, ao menos desejar recuperar esse estado".

A oração feita assim, continua o Catecismo, "faz-nos reconhecer a nossa dependência em todas as coisas, de Deus supremo Senhor; faz-nos progredir na virtude; alcança-nos de Deus misericórdia; fortalece-nos contra as tentações; conforta-nos nas tribulações; auxilia-nos nas nossas necessidades e alcança-nos a graça da perseverança final".

É ainda o Pe. Royo Marin que explica: "Os quatro valores da oração são: o meritório, como virtude que é; satisfatório, como obra penosa; impetratório das graças divinas, e de refeição espiritual da alma por seu contacto com Deus. Segundo São Tomás e a própria natureza das coisas, a oração vocal deve ter duas condições principais: atenção e profunda piedade."

Santa Teresa d'Ávila, Santa Teresinha e a oração

A grande Doutora da Igreja e reformadora do Carmelo, Santa Teresa d'Ávila, nos explica como entende a "elevação da alma a Deus" de que fala o Catecismo: "A oração não é outra coisa senão tratar intimamente com Aquele que sabemos que nos ama, e estar muitas vezes conversando a sós com Ele". Sobre a dificuldade que encontram nesse exercício, ela afirma: "Se falais muito bem com outras pessoas, por que vos faltariam palavras para falar com Deus?". Contudo, "Se a [pessoa] não adverte com Quem fala, o que é que pede, e a Quem pede, não chamo a isso oração, ainda que muito se mova os lábios. […] Quem tivesse o costume de falar com a majestade de Deus como falaria com seu escravo, não olhando se diz mal mas o que se lhe vem à boca […] não a tenho por oração, nem praza a Deus que nenhum cristão a tenha desta sorte".

Outra famosa carmelita e também Doutora da Igreja, Santa Teresinha do Menino Jesus, dá o seu testemunho sobre o modo de fazer oração: "Para mim, a oração é um impulso do coração, um simples olhar dirigido para o céu, um grito de agradecimento e de amor, tanto do meio do sofrimento como do meio da alegria. Em uma palavra, ela é algo grande, algo sobrenatural, que me dilata a alma e me une a Jesus."

Todos devem rezar

O Pe. Royo Marin tece algumas outras considerações sobre a oração, das quais citamos algumas. Diz ele que a oração "eleva e engrandece nossa dignidade humana: 'O homem nunca é maior do que quando está de joelhos'". Continua: "Tudo quanto fazemos estando na graça de Deus e sob a influência da caridade, pode dizer-se que é oração".

"Todos devem orar. A oração é obrigatória desde o começo da vida moral, isto é, quando se chega ao perfeito uso da razão", que muitos dizem que ocorre aos sete anos.

Explica ainda que devemos rezar não somente por aqueles que nos são próximos, como nossos pais, parentes, benfeitores etc., mas também "por todos aqueles a quem devemos amar [em Deus Nosso Senhor, porque também criaturas suas]. Portanto, por todas as pessoas que são chamadas à eterna glória [que são todos os homens]. Desse modo, [devemos rezar] inclusive pelos pecadores, hereges, excomungados e por nossos inimigos, sem excluir ninguém. Mas por todos estes basta pedir em geral".

Por um dever de caridade e de justiça, devemos rezar sempre pelas almas do purgatório. De caridade, tratando-se de familiares ou benfeitores. De justiça, se estão no purgatório por nossa culpa — "por exemplo, pelos maus conselhos e mau exemplo que lhes demos".

Embora muito pouco conhecida, é muito reveladora a seguinte afirmação do Pe. Royo Marin: "É sentença comum entre os teólogos que podemos pedir o aumento da glória acidental dos bem-aventurados; não da glória essencial (visão e gozo beatíficos), que é absolutamente imutável, e depende do grau de graça e de caridade que a alma tenha no momento da separação do corpo".

A oração perfeita

A oração mais perfeita é a que o próprio Nosso Senhor Cristo Jesus nos ensinou quando, estando um dia em oração, os discípulos pediram a Ele que lhes ensinasse a rezar. O Divino Redentor disse: "É assim que haveis de rezar". E ditou o Pai Nosso.

Por isso São Tomás diz que a oração dominical é perfeitíssima, já que nela se contém tudo quanto havemos de pedir, e na mesma ordem em que se deve pedir. Explica ele:

"A oração do Senhor é perfeitíssima: porque, como diz Santo Agostinho, se oramos reta e congruentemente, nada absolutamente podemos dizer que não esteja contido nesta oração. Porque a oração é como um intérprete de nossos desejos ante Deus, somente podemos pedir com retidão o que retamente podemos desejar. Pois bem, na oração dominical não só se pedem todas as coisas que retamente podemos desejar, mas até na ordem mesma com que se deve desejá-las."

Explica ainda o Angélico Doutor que, na primeira petição "santificado seja o vosso nome", pedimos que Deus seja glorificado por todos os homens.

Mas como Deus quer encontrar sua glória em nossa própria felicidade, na segunda petição dizemos "venha a nós o vosso reino", porque a verdadeira felicidade para nós está na posse do reino de Deus.

Mas essa felicidade está em que cumpramos em primeiro lugar a vontade de Deus de maneira tão perfeita que, se fosse possível, se assemelhasse à que se cumpre no Céu. Daí a petição "seja feita a vossa vontade, assim na Terra como no Céu".

Diz o Pe. Royo Marin sobre a segunda parte do Padre Nosso: "Pedimos o pão, ou seja, o indispensável para a vida (nada de riquezas e honras, que são bens fugidios e aparentes, que tanto se prestam para desviar-nos dos caminhos de Deus); e unicamente para hoje, 'com o fim de ficar obrigados a pedi-lo amanhã, e corrigir nossa cobiça' — como diz admiravelmente o Catecismo — e para que descansemos confiados e tranquilos nos braços da providência amorosíssima de Deus, que alimenta os pássaros do céu e veste as flores do campo com soberana formosura."

Seguindo São Tomás, escreve o Pe. Marin: "Indiretamente (per accidens) nos ordenamos à bem-aventurança removendo os obstáculos que a isso nos poderiam impedir. Três são estes obstáculos: o primeiro e principal, é o pecado, que nos exclui diretamente do reino dos céus, e por isto dizemos perdoai nossas dívidas. O segundo é a tentação, que é como a ante sala do pecado, e pode impedir-nos o cumprimento da divina vontade, e por isto acrescentamos não nos deixeis cair em tentação. O terceiro, finalmente, o constituem todas as demais calamidades da vida que possam perturbar nossa alma, a para isso dizemos livrai-nos do mal."

Conclui o Pe. Royo Marin: "É impossível pedir a Deus mais coisas, nem melhores, nem mais ordenadamente, nem com menos palavras, nem com maior simplicidade e confiança do que nesta sublime oração do Pai Nosso."

Contudo, falando de oração, não podemos deixar de mencionar a que nos é mais familiar, aquela aprendemos na nossa mais tenra infância dos lábios maternos, que é a Ave Maria. Ela nos une num ato de louvor Àquela que é a Medianeira de Todas as Graças, e que nos obtém de seu divino Filho tudo aquilo que nos é necessário para a nossa salvação. (Fonte: Agência Boa Imprensa https://www.abim.inf.br )